Nota de abertura: Esta farpa foi escrita antes da polémica estalar.
1. Ainda sobre as Conferências Democráticas do Casino
Agora estou com um grave problema. Como eu e o Filipe nos encontrámos ontem e já conversámos, não me apetece estar aqui a repetir tudo o que lhe disse, pois já não há elemento surpresa. Porém, a polémica ainda não terminou por aqui.
As palavras
São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.
Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.
Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?
Eugénio de Andrade, Coração do Dia
Deixo, apenas, alguns dos pontos, que, para mim, são mais importantes:
a) É obvio que não consultei só uma Enciclopédia;
b) A Diciopédia foi o único “livro” que me deu uma resposta clara. Perante a afirmativa que recolhi, penso que a atitude mais correcta não seja a de bater com o pé no chão, dizendo que não, que está errada, mas a de tentar procurar e perceber por que razão há alguém que, pelos vistos, fez um comentário diferente. É por isso mesmo que, neste momento, estou a tomar algumas providências (que frase tão ministerial!!!);
c) Gloriosa Faculdade de Letras do Porto? Está bem, tem algumas coisas boas, nomeadamente a biblioteca. Mas confesso que aprendi muito mais num ano fora dela do que em quatro lá dentro. Não, é mentira! Aprendi que dar duas horas de aulas sentado, com um olhar distante e sempre com um tom de voz de fastio; ou ler, durante as mesmas duas horas, uma resma de folhas amarelas (também há a variante em “post-it”!); ou assassinar textos é altamente anti-pedagógico e é preciso gostar muito daquilo para aguentar certas aulas. Felizmente, houve excepções; infelizmente, não foram muitas.
Urgentemente
É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.
É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos,
muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.
Eugénio de Andrade, Poemas
2. Ainda sobre alguém, que anda por aí
Ó homem, pare, de uma vez por todas, de subverter o que escrevo! A minha farpa sobre Belmiro de Azevedo, não tinha nada que ver com política, nem com esquerda nem com direita. Era, apenas e só, um texto satírico, com o objectivo de fazer rir.
O senhor está constantemente a ver esquerdalhada em tudo o que escrevo. A caça às bruxas já terminou! Eu nem sequer me interesso por política em termos ideológicos, não tendo, por isso, um partido. Interesso-me, sim, pelas acções que os partidos tomam ou não fôssemos nós governados por eles.
Começo a ter medo de escrever. Se algum dia, colocar no “blog” um texto com a palavra “Ah!”, parece que já estou a ver o seu comentário inflamado: “Eu já desconfiava, mas agora tenho a certeza, porque essa exclamação é típica de uma esquerda radical, sem visão, que quer esfrangalhar os país…”
Resumindo, não procure o Wally onde ele não está. Já percebi que sou o seu saco de boxe preferido, mas bata quando tiver razões para isso. Quando não as houver, não as invente!
Andanças do Poeta
Pelo céu cor de violeta,
que lindo,
que lindo vai o poeta.
Pôs uma camisa branca
e sapatos amarelos,
as calças agarradinhas
são da feira de Barcelos.
Pelo céu vai o poeta.
Sobe, sobe de bicicleta.
Eugénio de Andrade, Aquela Nuvem e Outras
E digo-lhe mais, aqui a “esquerdóide”concorda plenamente com as medidas que o PSD e/ou a direita têm para a educação portuguesa. Só não percebi a que diz respeito ao concurso de professores. Se se acabar o concurso, como se vai colocar o enorme número de professores? Qual é a alternativa? Por que razão o governo de coligação não as implementou?
Não quero, não
Não quero, não quero, não,
ser soldado nem capitão.
Quero um cavalo só meu
seja baio ou alazão,
sentir o vento na cara,
sentir a rédea na mão.
Não quero, não quero, não,
ser soldado nem capitão.
Não quero muito do mundo:
quero saber-lhe a razão,
sentir-me dono de mim,
ao resto dizer não.
Não quero, não quero, não,
ser soldado nem capitão.
Eugénio de Andrade, Aquela Nuvem e Outras
P.S.: Antes que se tirem conclusões precipitadas e disparatadas, quero informar que a inclusão de poemas de Eugénio de Andrade no meio dos textos é arbitrária, não tem nenhuma ideologia escondida. É simplesmente a minha maneira de homenagear o poeta.
Maria Ortigão