quinta-feira, junho 16, 2005

PONTAPÉS NA GRAMÁTICA E NÃO SÓ X


1. Insigne professora de Metodologia do Ensino de Português da Faculdade de Letras do Porto:
“— Vou contar o que me aconteceu ontem a mim própria!”

Comentário: Há pessoas que só olham para o seu umbigo!

Conselho

Sê paciente; espera
que a palavra amadureça
e se desprenda como um fruto
ao passar o vento que a mereça.

Eugénio de Andrade, Os Amantes sem Dinheiro

2. Insigne professora de Metodologia do Ensino de Português da Faculdade de Letras do Porto:
“— Está in ou line?”

Comentário: Eu diria que está completamente out off line!

Paisagem

Entre pinheiros três casas.
Uma azenha parada.
Uma torre erguida
de fraga em fraga
contra o céu de cal.
E um silêncio talhado
para o voo de um moscardo
alastra de casa em casa
sobe à torre abandonada
e sobe a azenha parada
tomba desamparado.

Eugénio de Andrade, Primeiros Poemas

3. Amiga, durante uma viagem de carro:
“— Se estiver muito vento, diz, que eu apago os vidros!”

Comentário: Se o vidro for apagado, não vai entrar ainda mais vento?

Lisboa

Alguém diz com lentidão:
«Lisboa, sabes…»
Eu sei. É uma rapariga
descalça e leve,
um vento súbito e claro
nos cabelos,
algumas rugas finas
a espreitar-lhe os olhos,
a solidão aberta
nos lábios e nos dedos,
descendo degraus
e degraus
e degraus até ao rio.

Eu sei. E tu, sabias?

Eugénio de Andrade, Poesia

4. O meu pai, falando sobre a sua vida no ultramar:
“— Fui para a aviação aérea!”

Comentário: Sempre foi um verdadeiro cabeça-no-ar, o meu papá!


As amoras

O meu país sabe a amoras bravas
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.

Raramente falei do meu país, talvez
não goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.

Eugénio de Andrade, Poesia




Maria Ortigão

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